29.1.14

12 Anos Escravo



A ideia original era escrever qualquer coisa bem-disposta sobre o filme e, mesmo sabendo que era um retrato realista da degradação humana mais vil, acreditei que conseguiria. Mas estava enganado. 12 Anos Escravo é uma espécie de Django ao contrário. No filme de Quentin Tarantino, o escravo vê-se libertado por um acaso do destino e decide aplicar-se na reparação dos males que lhe foram feitos pelos brancos maus. No filme de Steve McQueen (o outro Steve McQueen, não o das perseguições a alta velocidade por São Francisco abaixo), Solomon Northup começa livre, vê-se escravizado por um acaso bastante sacana do destino, e mostra-se empenhado em lutar para reconquistar a liberdade perdida.

Pelo menos até ao primeiro espancamento. Depois disso, as ganas justiceiras passam-lhe e resigna-se a ir sobrevivendo como pode. Como pessoa branca portuguesa, sabendo-se que Portugal é um país que não tem quaisquer culpas no cartório na questão da escravatura no Novo Mundo (estou a escrever isto com o boné vermelho do sarcasmo enfiado na cabeça), fica-se com um buraco no estômago e começa-se a ver todos os brancos com a mesma cara odiosa e a mesma atitude repelente. Seja o terrível Edwin Epps de Michael Fassbender, o miserável William Ford de Benedict Cumberbatch ou até o solidário (mas não em demasia) carpinteiro itinerante de Brad Pitt.

Fica-se também com vontade de estabelecer um paralelo com outro filme recente sobre a questão racial na história americana, uma coisa chamada O Mordomo com Forest Whitaker, que nos apresenta o outro lado, o lado mais simpático, o do negro que parte da adversidade e consegue triunfar pelo seu esforço e retidão, tornando-se o mais importante criado do país. Em 12 Anos Escravo, não há moral da história nem triunfo na adversidade, mesmo com o fim da escravidão do protagonista implícito no título. Somos conduzidos pela mão numa visita a uma galeria de horrores reais com “História  Verídica” escrito sobre a porta em letras luminosas e permite-se-nos liberdade suficiente para chegarmos a conclusões, se acharmos que são necessárias.

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